Suplementos de antioxidantes são muito ingeridos pelo público leigo ou mesmo frequentemente prescritos por médicos.
O uso de omega 3 tem ganhado popularidade devido aos seus efeitos anti-inflamatórios no endotélio vascular, portanto com o potencial teórico de reduzir a incidência de doenças cardiovasculares em indivíduos já expostos ou mesmo de prevenir novos eventos em indivíduos com risco cardiovascular "usual".
Diversos estudos observacionais prospectivos demonstraram benefício desses suplementos na redução de eventos cardiovasculares ou morte súbita.
Resultados estes, que foram contrapostos por estudos clínicos, entre eles, o ensaio clínico ALPHA OMEGA, que randomizou mais de 4 mil indivíduos com idade entre 60 e 80 anos com história de infarto agudo do miocárdio para receber doses de omega 3 por um seguimento de 40 meses, onde a análise final não constatou redução de desfechos duros nos indivíduos já infartados.
Destaca-se também recentemente , nova meta-análise de ensaios clínicos randomizados, que avaliou o efeito de omega 3 em diferentes subgrupos de pacientes com doença cardiovascular, também não demonstrando benefício dessa intervenção.
Para compreendermos a diferença entre os resultados frequentemente divergentes de estudos observacionais e ensaios clínicos, é importante entender como os fenômenos causais ocorrem e o conceito de independência da associação.
Na busca por determinar a causalidade dos fenômenos existentes, precisamos observar inicialmente se há associação entre as variáveis (fatores) avaliados.
Identificada a associação, devemos verificar se ela é realmente causal, quanto mais forte uma associação maior a probabilidade de ela ser causal, todavia, além da força desta associação, ela deve ser independente de fatores confundidores - confounding factors.
Uma associação pode ser afetada pelo viés de confusão que coloca em cheque toda cadeia de causalidade, já definido em abordagens prévias.
Como bem documentado , estes fatores de confusão podem ameaçar de maneira contundente a validade de um estudo observacional.
Uma variável que prejudica a independência de uma associação deve apresentar todas essas três características:
- Estar associada com à exposição
- Estar associada ao desfecho (doença)
- Não fazer parte da cadeia causal entre exposição e doença, criando uma associação "artificial" ou falsa
A esta variável damos o nome de variável confundidora.
Quais são os potenciais fatores confundidores?
No caso do uso de anti-oxidantes é bem provável , que em estudos observacionais , fatores como modo de vida - que envolvem dieta, atividade física ou mesmo a ausência de um fator de risco podem interferir na associação criando associações espúrias.
É bem provável que indivíduos que consomem suplementos vitamínicos sejam também mais saudáveis naturalmente.
Uma abordagem para identificar quais os fatores classicamente associados com exposição e doença seria prover uma análise dos fatores já identificados em estudos prévios.
Fatores de risco não modificáveis, como idade e sexo são sempre candidatos.
Outra forma de identificar estas potenciais variáveis, envolvem uma análise estatística inicial mais "liberal", buscando associações entre variáveis que podem ter associação com o desfecho através de plausibilidade biológica e depois controlá-las através de análises multivariadas.
A independência de uma associação será confirmada após a análise multivariada, onde a relação bruta entre exposição e doença é sempre diferente quando identificado o fator confundidor.
O que é análise multivariada ?
Na maioria das situações clínicas, muitas variáveis agem juntas para produzirem efeitos. No mundo multivariado, de múltiplos fatores causais essas relações são complexas. A análise multivariada serve para construir um modelo de predição independente e para participar da avaliação de causalidade de um determinado fator.
Diversas variáveis são colocadas no mesmo modelo matemático e analisadas simultaneamente - buscando ajustar (controlar) o efeito de todas essas variáveis, determinando então seu efeito independente.
Além disso, a análise multivariada serve para identificar interação, que é frequentemente confundida com confusão.
A interação refere-se apenas a modificação de efeito - por exemplo, uma droga tem efeito diferente em gêneros diferentes?
Os testes mais utilizados para realização de análise multivariadas envolvem o uso da regressão logística, ANOVA multivariada, ANCOVA e regressão linear múltipla.
Quando analisamos um estudo (nesse caso, observacional), devemos avaliar se ele é resultado de acaso, viés ou de fato é uma realidade.
Se nessa análise, associações forem identificadas devemos verificar se elas foram independentes, prestando atenção na realização de análises para controle de fatores confundidores
Portanto, como principais conhecimentos do post de hoje, devemos ter em mente que:
- A associação precisa ser forte e independente -
- Ensaios clínicos são menos susceptíveis a vieses de confusão quando comparados a estudos observacionais -
- Ao analisarmos um estudo que busque associações, na análise crítica, devemos buscar por análises multivariadas para controle de fatores confundidores -