sábado, 20 de janeiro de 2018

O uso de estatinas na ICC é imprescindível?


Desde o primeiro estudo clínico 4S, publicado em 1994, demonstrando benefício do uso de sinvastatina  na redução de morbimortalidade em uma população de indivíduos com doença arterial coronariana, surgiram outros trabalhados demonstrando benefício dessa classe medicamentosa.
Observou-se também um crescimento no interesse por estudar o benefício dessas medicações em determinados subgrupos, como idosos e pacientes com Insuficiência Cardíaca.

Classicamente, os pacientes com ICC sempre foram excluídos ou pouco representados no estudos de desfechos e contraditoriamente estudos observacionais e pequenos estudos experimentais demonstraram benefício do uso dessas medicações, contudo baseado no baixo nível de evidência dessas pesquisas , sujeitas a viéses de confusão e erros aleatórios o uso de estatinas nessa população continuava bastante contraditório.

Ao tentarmos provar o benefício de uma medicação em um estudo experimental, necessitamos de ter algum mecanismo biológico que possa implicar num teste de hipótese, lembrando sempre da máxima de que "Plausibilidade biológica não garante benefício clínico". 

A razão pela qual as estatinas poderiam ser benéficas nesse tipo de paciente está associada ao fato de que a etiologia isquêmica  possui associação causal com uma boa quantidade de casos de ICC, pacientes portadores de doença aterosclerótica são naturalmente mais "inflamados" com maior produção de citocinas inflamatórias - fisiopatologicamente as estatinas atuariam como mediadores inflamatórios, ademais a própria ICC é responsável por ativação adrenérgica , diminuição da atividade do sistema parassimpático  e disfunção autonômica. Modelos experimentais demonstram que as estatinas têm potencial de reduzir essas alterações.

Aquém da controvérsia do estudos, modelos experimentais demonstraram também motivos para que essas medicações pudessem ser deletérias. Existem evidências de que pacientes gravemente enfermos - como pacientes sépticos, grandes queimados, se beneficiariam de níveis mais elevados de colesterol.
Além disso, a inibição da coenzina Q10 - como mecanismo implicado ao uso das estatinas, poderia ser deletéria nos pacientes com ICC que já há possuem em níveis mais reduzidos.

Para responder essa  questão foi elaborado um grande ensaio clínico com acrônimo de CORONA
Este estudo randomizou 5011 pacientes com idade superior a 60 anos portadores de ICC classe II, III e IV de etiologia isquêmica para o uso de atorvastatina 10 mg x placebo.
O desfecho primário proposto foi observar redução de mortalidade por causa cardiovascular associada a redução de IAM e AVC. Enquanto que o desfecho secundário foi um combinado de morte por todas causas, morte por doença coronariana , morte por doença cardiovascular e número de hospitalizações.
Durante o follow-up de cerca de 02 anos não foi observada redução no desfecho primário no grupo intervenção , a despeito da redução das taxas de LDL  e diminuição das taxas de PCR ultrassensível.

Um estudo negativo também está susceptível a erros sistemáticos e erros aleatórios. 
Quanto a existência de viéses, embora o estudo tenho sido simples cego - o uso de desfechos "hards" diminui a possibilidade de viés de aferição.

Além disso , é muito importante questionar se um estudo foi negativo devido a erro do tipo II - O erro tipo II ocorre quando você  não encontra uma associação que existe, que não foi encontrada por baixo poder estatístico, o que não aconteceu no estudo acima , pois o mesmo teve um poder de 90 %  para as diferenças que propôs detectar.

Devido a conclusão de não evidência de benefícios,  os autores propuseram que o tempo do uso da rosuvastatina não tenho sido suficiente para promover os efeitos da redução de eventos cardiovasculares nos pacientes com ICC de etiologia isquêmica. 
Outro ponto a  considerar é que o estudo foi limitado a não envolver pacientes com ICC diastólica ou de etiologia não isquêmica não sendo passível de extrapolar seus benefícios para estes subgrupos.


O estudo GISSI-HF trial realizado de forma similiar respondeu algumas das questões acima ao não encontrar benefício no uso de rosuvastatina em ICC de qualquer etiologia.

Dessa forma, não existem evidências para recomendar o uso de estatinas na maioria dos pacientes com ICC - o uso não deve ser encorajado de maneira independente dos níveis de LDL- colesterol ou doença aterosclerótica.








   









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